O Instituto Butantan, vinculado à Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo, vai iniciar os testes em humanos da primeira vacina brasileira contra a gripe aviária H5N8. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) autorizou os ensaios clínicos na última terça-feira (1º de Julho). Agora, o Butantan aguarda a aprovação da Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep) para começar os estudos.
A vacina usa o vírus inativado e será aplicada em duas doses, com intervalo de 21 dias. O primeiro grupo-alvo inclui adultos entre 18 e 59 anos. Em seguida, os testes envolverão pessoas com mais de 60. Os pesquisadores esperam recrutar 700 voluntários para as fases 1 e 2, em centros de pesquisa localizados em São Paulo, Minas Gerais e Pernambuco.
Como base, o instituto realizou estudos em camundongos e coelhos, que indicaram segurança e resposta imunológica eficaz. A equipe pretende concluir o acompanhamento dos participantes até 2026 e, assim, obter dados robustos para solicitar o registro da vacina à Anvisa.
Vacina mira risco de nova pandemia
Segundo o diretor do Butantan, Esper Kallás, os vírus aviários, como o H5N8, representam uma ameaça crescente à saúde pública. Embora inicialmente afetem aves, alguns tipos já atingem mamíferos — e podem, com o tempo, se adaptar ao organismo humano. Para ele, o cenário acende um alerta global.
“Esse vírus está se aproximando das condições necessárias para se transmitir entre pessoas”, afirmou Kallás. Desde 2023, o instituto tem investido no desenvolvimento dessa vacina como forma de antecipar-se a uma eventual epidemia ou pandemia.
Além disso, ele destacou que a ameaça não é apenas nacional. “A comunidade científica internacional compartilha da mesma preocupação”, afirmou. Para o diretor, a vacina pode oferecer uma resposta rápida, caso o vírus comece a circular entre humanos.
Transmissão entre humanos ainda não ocorreu
A diretora médica do Butantan, Fernanda Boulos, explicou que o maior risco está na possível transmissão de pessoa para pessoa, o que ainda não aconteceu. Contudo, o vírus H5N8 é altamente mutável e, se adaptar-se ao sistema respiratório humano, poderá iniciar uma epidemia.
Segundo ela, a vacina em teste usa o vírus morto, incapaz de causar infecção. “Nossa meta é avaliar se ela é segura e se induz uma boa resposta imunológica. Assim que tivermos o aval ético, começaremos os testes nos cinco centros de pesquisa”, disse.
Taxa de letalidade preocupa autoridades globais
A Anvisa alertou que variantes como H5N1, H5N8 e H7N9 têm alto potencial de mutação e letalidade. Entre 2003 e 2024, o mundo registrou 954 casos humanos de gripe aviária, com 464 mortes — uma taxa de letalidade de 48,6%, bem acima da verificada na pandemia de covid-19.
Desde 2021, essas variantes provocaram a morte de 300 milhões de aves em 79 países e afetaram 315 espécies silvestres. No Brasil, o Ministério da Saúde afirma que não há casos humanos confirmados, mas orienta a população a evitar contato com aves doentes ou mortas.
Brasil segue em alerta e já possui plano de contingência
Mesmo sem registros em humanos, o país reforçou a vigilância. Em dezembro de 2024, o Ministério da Saúde lançou o Plano de Contingência Nacional para Influenza Aviária. A iniciativa orienta ações de vigilância, diagnóstico laboratorial, assistência médica e comunicação em saúde.
Além disso, o governo brasileiro mantém estoques do antiviral oseltamivir, usado no tratamento de influenza, e dispõe de tecnologia para produzir vacinas, caso seja necessário.
Em junho de 2025, o Brasil voltou a ser considerado livre da gripe aviária em granjas comerciais. O reconhecimento veio após o país cumprir um período de 28 dias sem novos casos, segundo critérios da Organização Mundial de Saúde Animal (OMSA).